quarta-feira, 30 de julho de 2008

Tempus Fugit - Capítulo 1.2

Tinha já perdido completamente a noção da duração actual, naturalmente relativa, do momento morto. Aproveitava-o para passear pelas ruas onde tudo estava estático, parecia que estava dentro de um filme em que alguém tinha pressionado o botão de pausa. A verdade é que já não o incomodava, proporcionava-lhe até um certo conforto, uma sensação de privacidade. Era como se estivesse sozinho no mundo e sabia bem. Tinha consciência que era uma pessoa que lidava bem com a solidão, tinha até já por diversas vezes fantasiado com situações semelhantes, em que estava sozinho no mundo, mas sempre imaginou que, numa situação real não conseguiria ser isento de angústia, que sofreria com a falta de outras pessoas, no entanto estava a concluir que afinal não era verdade. Podia considerar que estava sozinho no mundo, pelo menos durante o momento morto, e isso não lhe provocava qualquer tipo de emoção negativa. Esta questão não deixou de o inquietar. A sensação de conforto não significaria provavelmente nada de bom sobre si. Seria uma pessoa fria e misantropa? De facto sempre se considerou uma pessoa muito mais racional que emocional, mas isto era provavelmente um exagero. Como podia sentir-se bem sabendo que era o único ser num planeta. Planeta? Qual seria a extensão deste fenómeno? Atingiria todo o universo? Pensou. Ocorreu-lhe que nunca se tinha lembrado de observar o céu durante o momento morto. Olhava para o céu, claro, mas não durante tempo suficiente para verificar se a lua se movia ou estaria também estática no firmamento.

Estava a preparar-se para se recostar num banco de jardim a observar o céu quando a sua atenção foi distraída pelo passar de algo que apenas pôde descrever como uma sombra. Algo provocou uma variação da luminosidade que, como tudo o resto, se mantinha completamente estática durante o momento morto. Imediatamente a seguir tudo voltou ao normal. Deixou-se ficar sentado, observando as pessoas a voltar à vida, sem qualquer indício de se terem apercebido que alguma coisa se tinha passado. Mas na sua mente apenas uma questão estava a ser ponderada. O que teria provocado aquela sombra? A não ser que tivesse sido enganado pelos seus sentidos, não era o único a movimentar-se durante o momento morto. Não estava sozinho.

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