Quando os primeiros raios de luz solar investiram quarto adentro, Maria recuperou rapidamente a consciência e com ela veio a expectativa sobre o que a esperaria naquele dia, do outro lado da pequena porta. Olhou para o lado, Joaquim ainda dormia profundamente. Deve ser ainda muito cedo, pensou, posso ir dar uma espreitadela antes de ele acordar. Levantou-se cuidadosamente para não acordar Joaquim e foi directa à casa de banho.
A desilusão foi avassaladora quando afasta o armário e a porta não estava lá. Ficou ainda alguns minutos estática a olhar para a parede nua sem saber muito bem o que fazer. Aquela era a sua porta, a sua escapatória dos problemas do mundo real, precisava dela, porque é que já não estava lá, ponderou. Não se conformava com a situação, queria poder continuar a visitar aquele mundo paralelo, já lhe custava até imaginar a sua vida sem ele, seria monótona e difícil. Só havia uma coisa que poderia fazer, procurar o velho prestidigitador.
Descobriu onde e quando era o próximo espectáculo e compareceu. Esperou ansiosa, na última fila, pelo fim da apresentação em que o prestidigitador, como sempre, conseguia facilmente a simpatia do público através do seu carisma natural. Esta simpatia era amplificada pela incontornável evidência de que, quando estava no palco, cada gesto seu estava carregado de amor pelo que fazia, pela sua arte.
Quando, depois do inevitável aplauso de pé, os espectadores começaram a sair, Maria dirigiu-se ao artista. Lembra-se de mim, perguntou hesitante ao velho ilusionista. Claro que sim, minha cara, apesar da minha idade, nunca me esqueci de ninguém que tenha participado num dos meus números, respondeu, o que posso fazer por si? Num tom de quase súplica, Maria contou ao velho artista tudo o que tinha acontecido desde a última vez que o tinha visto, que ouviu tudo sem demonstrar qualquer surpresa. Por fim contou-lhe do desaparecimento da pequena porta e implorou-lhe que a fizesse voltar a aparecer. Com um sorriso paternalista, o velho ilusionista demorou alguns momentos a responder. Minha querida, a porta continua a existir, disse. E continua no mesmo sítio de sempre, aqui, prosseguiu o velho prestidigitador dando duas suaves pancadas no centro da testa de Maria com o dedo indicador, tens apenas que aprender a abri-la sem a minha ajuda.
2 comentários:
Toda história é fantástica ;)...fez-me abrir algumas portas...gostei bastante ;)
Ainda bem :D
Não deixem a porta desaparecer!
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