segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011
Dia 3
sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011
Dia 2
quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011
Dia 1
terça-feira, 22 de fevereiro de 2011
Estrada
sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011
Optimismo
quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011
Viver
O Gervásio tinha sempre muito medo de ser mal interpretado. Às vezes apetecia-lhe mandar uma daquelas bocas cáusticas, mas tinha medo que o levassem a sério.
Um dia, o Gervásio ponderou que a sua preocupação em não ser mal interpretado o estaria a impedir de ser genuíno, de ser ele próprio.
Pensou que não poderia viver sempre em função dos outros e que se condicionasse sempre as suas acções pelo impacto que teriam nos demais, não seria ele, mas sim uma imagem daquilo que achava que os outros queriam que ele fosse.
Então, o Gervásio decidiu mudar. Começou a mandar todos os amigos para o caralho sempre que lhe apetecia, mesmo aqueles que sabia mais sensíveis e viveu feliz para sempre. Quero dizer... mais ou menos feliz... Houve uns amigos que levaram algumas coisas a mal, talvez tivesse a ver com a sua insegurança, talvez não, mas houve com efeito alguns amigos que decidiram interpretar de má fé a genuinidade do Gervásio e a coisa não correu muito bem, mas, tirando isso, viveu feliz para sempre, minimamente feliz, pelo menos, porque depois há o problema das mulheres. Podemos achar que elas estão horríveis e, engolindo em seco, dizer que estão lindas. Mas achar que estão lindas e, apenas pelo impulso idiota da palhaçada, dizer que estão horríveis, não, isso é erro crasso e energúmeno.
Por coisas deste tipo, o Gervásio nunca conseguiu ter sucesso com as mulheres, mas viveu, vá, mediocremente feliz para sempre, se não contarmos a sua inata capacidade de irritar animais de estimação... Nem as outras questões sociais, mas pronto, viveu... Não foi obviamente para sempre, até porque a saúde o traiu algo cedo, mas pronto, viveu... E isso é que interessa!!
segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011
Comida
– Ó Maria, este jantar hoje está muito fraco. O que é que se passa?
– Não se passa nada. Uns dias está melhor, outros está pior. É só comida. Come, mas é.
– Só comida? Só comida?! Tu não digas isso, por favor. A comida é só a tua matéria-prima. Tu és uma artista, cada prato é uma obra de arte digerível! Tu pegas em coisas vulgares, juntas-lhe técnica, inspiração, criatividade… Alma, juntas-lhe a tua alma e crias algo novo, algo que não existia antes. Crias uma representação comestível daquilo que tu és. Não voltes a dizer que é só comida!
– Obrigado, Manuel, sabe muito bem ouvir isso e saber que dás valor.
– Claro que dou valor!
– Queres mais banha nos teus couratos?
– Sim, se fazes favor.
sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011
REM
Estou no corredor de um edifício familiar, a fumar um cigarro junto de um cinzeiro de chão. Noto que as pessoas que passam olham muito para mim, mas não ligo e continuo a fumar tranquilamente. Quando vou para apagar o cigarro, olho para baixo e reparo que estou nu da cintura parar baixo. Aí começa a ansiedade. Embora quem passa não pareça incomodar-se muito com a minha falta de preparos, começo a ficar extremamente desconfortável e envergonhado. Começo a vaguear pelos corredores à procura, sem sucesso e com o stress a aumentar cada vez mais, de um sítio para me esconder. Nisto, vejo-me ao longe. É uma cópia minha, mas ao contrário de mim, está nu da cintura para cima. Não estranho e instantaneamente penso que se me fundir com ele fico totalmente vestido. Corro direito ao meu clone que, assim que se apercebe de mim, como se soubesse em que é que eu estava a pensar, começa também a correr para mim. No momento do impacto fundimo-nos, mas a coisa não corre como eu esperava e, em vez de ficar todo vestido, fico é completamente nu. O stress transforma-se em pânico quando vejo um grupo de pessoas a aproximar-se. Corro para o outro lado e de repente estou num grande salão e gente aproxima-se de todos os lados. Sem rota de fuga, tenho que limitar-me a assistir, impotente, enquanto as pessoas se aproximam e formam uma roda à minha volta. Assim que a roda se fecha, as pessoas param e ficam ali a olhar para mim, rosto rígido, mas com um brilho no olhos divertido e maquiavélico. Sem saber o que fazer, grito a plenos pulmões para que me deixem passar. Pergunto o que querem de mim, mas ninguém responde. Neste momento olho para cima e apercebo-me que o tecto desapareceu. Consigo ver o céu de dentro do edifício e está a relampejar violentamente. Instantes depois, um olho titânico, com gigantescas pestanas aparece onde antes estava o tecto. Quando enormes lágrimas corrosivas começam a jorrar do olho gigante, abrindo buracos no chão, perigosamente perto de mim, já não estou muito preocupado por estar nu, quero é sair dali. A necessidade de fuga torna-se premente. Reúno todas as minhas forças e, correndo tão depressa quanto consigo, vou direito à roda de pessoas que me cerca. Quando estou prestes a abalroar quem está entre mim e a liberdade, ainda tenho um segundo de satisfação achando que vou conseguir e depois acordo, suado e com o coração aos pulos.
Tem sido assim todas as noites há já quase uma semana. O que é que acha que significa, doutor? Doutor?...